Quase todos pretos

Dias atrás, acompanhando o Secretário Municipal de Direitos Humanos e Cidadania Eduardo Suplicy em uma agenda com pessoas em situação de rua, constatei as profundas relações históricas e sociais dessa população com a dos afrodescendentes em nosso país. Ali, a presença de brancos era quase inexistente. Após ouvir vários depoimentos, notei que as reivindicações em muito se assemelhavam a do restante de negros que ultrapassaram a barreira econômica e ocupam o patamar da tal classe média brasileira.

A discriminação social e racial, acasalada à violência policial, aparecem no topo dos problemas daquelas pessoas que chegaram à situação de rua por problemas econômicos, desarranjo familiar, seja desilusão amorosa ou dramas ocasionados por perda de emprego, entre outros. Menos de 10% se deu por envolvimento com drogas, doenças mentais ou implicação criminal como constatou recente pesquisa do governo federal.

Na condição de Secretário da Igualdade Racial da cidade de São Paulo logo percebi, naquele encontro, que eu estava diante de um problema secular, que teve início no período da escravização onde os negros que não serviam para o propósito do branqueamento, nem para economia, seja por idade ou doença, eram abandonados ao seu próprio destino nas ruas e praças brasileiras. Problema este que se legalizou em 13 de maio de 1888, na assinatura da Lei Áurea, que, sem indenização, empurrou os negros para muito além de ruas e praças e potencializou o surgimento de espaços abandonados pelo poder público (favelas), herança da maldita escravização, registrada na cor da maioria de seus moradores.

De lá para cá, pouco mais de um século se passou e quase nada mudou, apesar das adversidades. Demos muitos heróis para esse país, seja na música, no futebol, ciência e mesmo na literatura. Heróis como Francisco Erasmo que vivia em situação de rua e que perdeu sua vida para salvar outra, bem de frente às “portas fechadas” da catedral da Sé. Morreram ali um herói com dois tiros e um vilão com vários tiros da polícia, os dois, vítimas da mesma tragédia: a histórica discriminação racial e social brasileira.

Texto: Mauricio Pestana – Secretário DE Promoção da Igualdade Racial /SP

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